Um presente para Santarém: Projeto de Lei para regulamentação da APA Maicá

Fonte: Terra de Direitos

Na semana em que comemoramos o aniversário de Santarém, diversas organizações dos movimentos sociais e entidades do oeste do Pará presenteiam a “Pérola da Tapajós”, como é conhecida a cidade, com um Projeto de Lei que pretende garantir a biodiversidade do Lago do Maicá. O exuberante recanto de águas, localizado à margem direita do Rio Amazonas, é berçário de muitas espécies de peixes e também fonte de renda para comunidades do entorno que ali exercem, de modo sustentável, a pesca e o agro-extrativismo.

Pela assessoria de comunicação da Terra de Direitos

Depois de dois anos de muitas reuniões, as organizações, lideranças comunitárias e entidades locais, com apoio de professores daUfopa, concluíram o Projeto de Lei para regulamentação da Área de Preservação Ambiental (APA) do Maicá e o apresentaram nesta terça-feira, 21 de junho, na Câmara Municipal, através de encaminhamento pela vereadora Ivete Bastos (PT). A parlamentar, porém, ressalta que foi “porta-voz de um conjunto de organizações que tomaram a iniciativa de elaborar a proposta”.

A APA Maicá já estava prevista no Plano Diretor de Santarém, aprovado em 2006, mas ainda precisa ser regulamentada para ser tornar realidade. Sara Pereira, integrante da FASE e do grupo que está articulando a criação da APA, considera ser esse “mais um passo fundamental na luta em defesa do Lago do Maicá contra a pretensão de construção de empreendimentos portuários por parte de empresários do agronegócio. Toda a rica biodiversidade do Lago do Maicá estará ameaçada, caso os portos sejam construídos ali.”

Após o término da sessão em que foi apresentado o Projeto de Lei na Câmara, as lideranças comunitárias presentes ao ato reuniram-se com a vereadora Ivete Bastos e com os membros da Comissão de Meio Ambiente, os vereadores Silvio Amorim (PSL) e Geovani Aguiar (PTN), que expressaram apoio para a aprovação e regulamentação da APA Maicá. Eles também se comprometeram em conversar com os demais vereadores para sensibilizá-los da importância da pauta e para que a tramitação na Câmara não seja demorada.

O texto do Projeto de Lei foi elaborado colaborativamente pelas Associações de Moradores dos Bairros Pérola do Maicá e Jutaí,Conselho Comunitário de Segurança da Grande Área do Maicá, Colônia de Pescadores Z-20, Pastoral Social da Diocese de Santarém, Federação das Associações de Moradores e Organizações Comunitárias de Santarém (FAMCOS), Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), STTR, FASE, SAPOPEMA e Terra de Direitos.

Jucenil Coelho, diretor de Relações Públicas e Culturais da Colônia de Pescadores Z-20, explica os motivos da mobilização. “A gente demarcou e fez o mapeamento da APA e ficou tudo acertado com as comunidades da aŕea do Lago do Maicá. É muito importante a gente preservar o Lago, o nosso meio ambiente, a diversidade que tem ali. A gente está nessa luta para não permitir que essas pessoas que vêm de fora para construir portos deixem essa devastação na área do Lago.”

Segundo Wandicleia Lopes de Sousa, da Sapopema, organização que atua junto aos pescadores do Baixo Amazonas, “é preciso que a APA seja aprovada dentro dos trâmites da Câmara dos Vereadores de Santarém, considerando e reconhecendo a região do Maicá como sendo de proteção ambiental, assim como está previsto no Plano Diretor da cidade.” Ela complementa: “A importância de ter a APA no Lago do Maicá é garantir os recursos naturais para as populações que ali residem e dependem dele, de modo especial os pescadores. Dentro da área da APA do Maicá tem mais de 1200 pescadores artesanais que sobrevivem da pesca. Com esses grandes projetos que chegam a Santarém, os pescadores se encontram ameaçados, tanto na sua segurança alimentar como na geração de renda, já que eles sobrevivem da pesca artesanal para garantir o sustento das suas famílias.”

Dileudo Guimarães, presidente da Federação das Organizações Quilombolas de Santarém (FOQS), que participou das reuniões para a elaboração do Projeto de Lei, está satisfeito com o fato de que os limites propostos para a APA Maicá não se sobrepõem aos territórios das comunidades quilombolas. “Vizinhos à APA estão as nossas comunidades quilombolas: Bom Jardim, Murumurutuba, Murumuru, Tiningú, Nova Vista e São José do Ituqui. Nós temos um direito diferenciado nas nossas áreas quilombolas. Elas sendo tituladas como comunidades quilombolas, a gente poderá fazer o nosso Plano de Manejo, o nosso plano de utilização dessas áreas.”

Sara Pereira ainda lembra que “as diversas organizações que estiveram presentes ao ato de entrega do Projeto de Lei na Câmara dos Vereadores irão cobrar das autoridades que essa reivindicação seja atendida, porque já é uma proposta prevista em lei que faltava apenas ser regulamentada.” Quanto à questão da área da APA Maicá ser vizinha às áreas das comunidades quilombolas, ela também reconhece a importância de considerar as suas especificidades: “As organizações quilombolas também fazem parte desse grupo de trabalho que está propondo a criação da APA. Os territórios quilombolas não ficaram dentro da APA justamente por conta de atender as suas necessidades. Todas as comunidades quilombolas estão fora da área demarcada pela APA, que tem um objetivo maior: preservar não só a biodiversidade, mas inclusive o modo de vida das pessoas que vivem a tradição. Entendemos que isso é conciliável como o modo de vida dos quilombolas.”

Valdeci Oliveira, da Pastoral Social da Diocese de Santarém, narra a trajetória do Projeto de Lei: “Tudo começa a partir de debates com os Movimentos Sociais de Santarém. A gente tem travado, nos últimos dois anos, uma luta em relação à construção dos portos no Lago do Maicá. A partir de debates e seminários que realizamos, fizemos propostas de ações concretas. E uma das ações foi trabalhar um Projeto de Lei de iniciativa popular para a regulamentação da APA do Maicá, uma vez que ela está com mais de dez anos dita no Plano Diretor, mas que nunca foi regulamentada por falta de interesse do poder público. Agora, as comunidades, sentindo a necessidade dessa regulamentação, pois elas ficam em situação frágil diante desses empreendimentos que são colocados aqui para a nossa região, tomaram a iniciativa de fazer o debate. Conseguimos definir uma área de abrangência, quais as comunidades vão estar dentro da área, como será essa APA e quem vai compor o Conselho Gestor, tudo isso está definido dentro do Projeto de Lei.”